segunda-feira, 17 de março de 2014

Savannakhet

Savannakhet é uma cidade sonolenta plantada no sul do Laos, à beira do Mekong. Tão sonolenta que uma pessoa quase adormece ao deambular pelas suas avenidas semi-desertas, passeando entre uma infinitude de pequenos estabelecimentos multi-funções e dúzias de cães que vegetam ao sol, à espera da melhor oportunidade para nos virem perseguir os calcanhares.

Não se tarda muito a encontrar uma certa circularidade na lógica desta lugar. Passado o primeiro templo, é como se se tivessem visto todos. Dobrada a primeira esquina, ficou esgotado o potencial de surpresa de cada rua. A primeira e a última banca vendem as mesmas pilhas de baguetes tostadas e os mesmos cachos redondos de bananas curtas ainda por amadurecer. Exagero, é certo, mas talvez não tanto quanto possam pensar.

A qualidade redentora é a extrema simpatia de quem cá vive. Mas nem os seus sorrisos francos, nem as suas interpelações cordiais, nem mesmo as suas amabilidades frequentes conseguem desmentir a nostalgia que se descola de cada centímetro da cidade e do seu silêncio omnipresente.

Em completa justiça, nem tudo é culpa de Savannakhet. Acredito que para qualquer outro viajante possa parecer um pequeno oásis de sossego onde passar uns dias tranquilos a caminho do sul mais profundo ou um bom ponto departida para uns dis de trekking na região circundante. Mas para mim, que não venho pelo trekking, que estou na iminência de celebrar um Ano Novo e que acabo de dizer adeus a onze dias festivos passados na melhor das companhias, a cidade tem o sabor triste de um anti-clímax.

Cheguei aqui no autocarro das cinco da manhã, depois da viagem de todas as atribulações, mesmo a tempo de ir bater à porta da pousada e fazer emergir do quarto do rés-do-chão o dono, estremunhado. Sem check-in nem outras diligências, foi-me passada uma chave para a mão, convertendo-me em dona e senhora de um quarto modesto, húmido e alcatifado da pior maneira.

Nessa manhã, passei quase uma hora a caminho do Consulado do Vietname, que não havia jeitos de encontrar. Fazendo prova da amabilidade local, um senhor idoso a quem tinha perguntado pelo caminho veio ao meu encontro numa carrinha de porta aberta e ofereceu-se para me depositar no local certo. Já sei o que se diz de conversas e boleias com estranhos, mas às vezes o coração sente, antes de o cérebro dizer que não, que está entre boa gente. E assim fomos, por um ou dois minutos, trocando umas palavras em francês, que só a geração mais velha do Laos ainda recorda.

No Consulado a conversa foi outra. Uma simpatia, também, mas pouquíssimo inglês e nada de francês ou outro idioma perceptível em que pudessemos comunicar. Após muitos esforço, consegui descortinar a informação de que o visto demoraria três dias.

Arrepanhei cabelos e chiei interiormente. Três dias ali pareciam-me mais do que a minha saúde mental podia suportar naquele momento, sobretudo porque um desses dias seria a passagem de ano. Mas a verdade é que viera ali quase de propósito para obter o visto, porque me tinham dito que o serviço era melhor que na Embaixada em Vientiane.

Depois de uns segundos de entrega à auto-crítica feroz por ter contrariado o meu instinto - que seria ter tratado deste assunto o quanto antes quando estivera em Vientiane - decidi que a melhor solução era tentar passar o ano em Pakse, pequena cidade onde supunha que, ainda assim, houvesse mais animação e hipótese de conhecer gente. E, depois do meu périplo pelo sul do Laos, regressaria à capital, para tratar do visto e daí partir para Hanoi. De certo modo fazia sentido, até, porque eu queria começar pelo norte do Vietname e o autocarro entre Vientiane e Hanoi parecia mais eficiente em termos de tempo que qualquer outra solução de transportes terrestre mais a sul.

Reconfortada com este reformular do problema, passei o resto do dia em passeio sem destino certo, almocei numa pequena pérola de restaurante vegtariano que decobir e terminei a tarde na zona ribeirinha, sentada num pequeno miradouro sobre o rio, bebendo uma Beerlao e vendo a luz do sol fazer das suas travessuras sobre as águas. 

Na manhã seguinte, bem cedo, tomei assento no autocarro para Pakse, onde passaria o ano antes de seguir para Si Phan Don, as quatro mil ilhas. E ainda bem que o fiz, pois em Pakse esperava-me o inesperado. Mas isso é assunto para outro post!

A viagem de todas as atribulações - parte II

Num impulso, num mero capricho quase descerebrado saído não sei de onde, ouvi-me perguntar:

- Ainda estamos perto de Vientiane?

Aparentemente sim, mais ou menos. A verdade é que não fazia ideia de há quanto tempo estavamos na estrada. Não podia ter sido muito, mas no meu torpor feito de nervos já não sabia dizer quanto seria muito ou pouco. A única coisa que sabia era que estavamos no meio de uma estrada onde se viam carros e gente e isso, surpreendentemente, pareceu bastar-me, porque mais uma vez ouvi a minha voz elevar-se no ar e decidir:

- Eu fico aqui.

E então os acontecimentos precipitaram-se quase sem eu dar conta, como numa realidade paralela bizarra que se tivesse aberto ali. Do outro lado da porta vi surgirem dois olhos miúdos reluzindo no escuro, enquanto o passageiro com quem tinha vindo a falar me dizia:

- O meu irmão pode levar-te à estação.

Algures num canto esquivo da minha cabeça perguntei-me de onde teria vindo este irmão, caído assim do céu, ao mesmo tempo que outro canto do meu cérebro ia registando como ele era novinho, franzino, demasiado pequeno para aguentar a mota que conduzia, a minha pessoa e quatorze quilos de mochilas.

Mesmo assim desci, com armas e bagagens atrás, impelida por uma força invisível. O rapazito olhou para mim e, possivelmente mais aterrado que eu, ainda gritou qualquer coisa ao irmão, que lhe respondeu encorajadoramente antes de as portas do autocarro se cerrarem e este desaparecer no escuro da noite.

Voltei a contemplar a cena. Parecia-me impossível que viajassemos todos naquela mota e sobrevivessemos para contar a história. Ainda balbuciei:

- Tuk tuk, I will call a tuk tuk.

Mas o rapaz acenou com as mão e disse apenas:

- No money, no money.

A cena repetiu-se até eu ceder ao inevitável. Trepei para a mota, que quase caiu ao chão com o peso dos meus carregos, e assim que nos ajeitámos conforme foi possível lá partimos à desfilada, zumbindo entre os carros.

Quando me vi chegar à estação de autocarros, houve um suspiro de alívio no meu peito que se misturou com uma profunda gratidão por este rapaz que, sem me conhecer, tinha empenhado o seu tempo e o seu combustìvel para me trazer sã e salva a um porto mais seguro. Perante a insistência de "no money" ofereci-lhe tantos obrigadas e vénias quantos pude e corri para o guichet de informações da estação.

Começava, agora, a segunda parte do meu problema. Como já não tinha o recibo da guesthouse mas apenas o bilhete correspondente ao autocarro onde me tinham erroneamente metido, foi preciso explicar em detalhe o que se tinha passado.

Uma outra alma caridosa, que me pareceu ser o responsável de turno, aceitou ligar para a pensão em causa. Falei com duas ou três pessoas diferentes, uma das quais gritava insistentemente "why you didn't go on the bus!". Depois de repetir as minhas desventuras umas poucas de vezes e de guinchar de volta "because it was the wrong bus!" lá consegui que me pusessem no autocarro da noite para Savannakhet.

Como depois me apercebi, era um sleeper bus daqueles em que se partilha um cubículo rectangular sem assentos - uma espécie de cama, portanto - com outro passageiro. Mas eu nem quis saber! Tudo ali me parecia o céu, porque estavamos a caminho da cidade certa, à hora certa, e só isso me importava.

É claro que não há duas sem três, e embora não o soubesse ainda, ao chegar à pensão de destino, pelas cinco e meia, ficaria ainda uns bons dez minutos a bater à porta no escuro, sem que ninguém viesse abrir. Foi apenas por sorte que uma vizinha me viu ali e, percebendo o meu drama sem palavras, foi bater numa porta traseira, acordando assim o recepcionista que dormia a sono solto. A terceira alma caridosa, numa noite tão cheia de azares e medos como de sortes inesperadas.

A verdade é esta: tal como a comédia e o drama, também o azar e a sorte são, no fim de contas, uma questão de perspectiva. E é por isso que mais do que dos nervos e da frustração, me ficaram gravadas desta noite as estrelinhas reluzentes que o destino quis colocar no meu caminho e que, sem interesse nem ganho pessoal, me guiaram suavemente através das águas revoltas até terra firme. Nada de espantar num país como o Laos, onde um coração grande e generoso parece ser o maior atributo das gentes que cá vivem.

A viagem de todas as atribulações - parte I

Tinha dito adeus às minhas companheiras de duas semanas de viagem. Tinha refeito a mochila e comprado em devido tempo o bilhete de autocarro para Savannakhet, numa guesthouse perto da minha. Tinha-me preparado com repelente e um casaco extra para o frio artificial mas ártico com que os transportes colectivos de passageiros insistem em brindar-nos nesta zona do mundo. E mais: porque me tinham mandado, e nestas coisas eu sou relativamente bem mandada, tinha comparecido à hora certa para apanhar o pick-up que me levaria da guesthouse, no centro da cidade, à estação de autocarros. Tudo, absolutamente tudo, se alinhava cosmicamente para um desfecho satisfatório. Mas como sempre acontece, a vida tinha outros planos.

As coisas começaram de forma insuspeita. O transporte para a estação deu as mil e uma voltas do costume, percorrendo a cidade para apanhar nos respectivos alojamentos tantos passageiros quanto os seus bancos comportavam. Depois correram-se as estações de autocarros, primeiro a dos que iam para a Tailândia, por último as dos que iam para o Vietname e, ao que me disseram, também a minha, que ia já ali para uma cidade mais a sul.

O motorista mandou sair quem viajava para Hanoi, no Vietname, e disse-me que esperasse. Ao fim de poucos segundos, repareceu apressado e levou-me a passos largos a um senhor sentado perto de um autocarro já em funcionamento. Ali me trocaram o recibo da guesthouse por um bilhete propriamente dito. Até aqui tudo bem. Só que...

Mandaram-me entrar a correr para o autocarro, que já ia quase em andamento, de tal modo que nem tempo tive para colocar a mochila grande no compartimento próprio, situado na parte inferior do veículo. Faltava uma hora para o horário que me tinham dito que o autocarro cumpriria. Primeiro sinal de alerta. Conforme pude, ainda perguntei atabalhoadamente:

- Savannakhet? Is this the bus to Savannakhet?

O motorista, que claramente não falava inglês, limitou-se a acenar e madou-me sentar. Fui à procura do meu lugar, apenas para descobrir que, ao contrário do habitual, não havia lugares marcados. Segundo sinal de alerta.

Lá encontrei um sítio e o autocarro, que entretanto tinha estacionado noutro ponto da estação, acabou de se encher em menos de nada. Nisto um funcionário, claramente encarregado de optimizar o espaço para que coubessem todos os que tinham que caber, decidiu que eu tinha de deixar o meu lugar de janela e passar para um lugar no corredor, ao lado de uma senhora idosa que ocupava já banco e meio com uma mercadoria fina e comprida que recusava colocar noutro local que não entre ela e a janela. Depois de alguns protestos infrutíferos resignei-me e encaixei-me o melhor que pude no espaço sobrante.

Prontos para iniciar viagem, eis que se ligam em todo o habitáculo umas luzes psicadélicas dignas da melhor disco dos anos oitenta e algo que apenas posso descrever como um inferno musical aos altos berros desata a jorrar de colunas escondidas algures no tecto. Nunca, na minha curta vida de viajante, tinha visto nada daquilo. Terceiro sinal de alerta.

Por esta altura começava a nascer da dúvida a certeza muito concreta: este não podia ser o autocarro certo! Olhei ao meu redor. Caras locais, alheadas do dilema em que me encontrava, mas nem um único turista a bordo, nem uma alminha que correspondesse aos meus esforços para comunicar num idioma estrangeiro. Quarto sinal de alerta, e por esta altura o meu coração começara a bater desenfreado, na certeza da desgraça iminente.

Por fim, encontrei um passageiro que falava inglês.

- Desculpe, este é o autocarro que chega a Savannakhet por volta das quatro e meia da manhã?

A resposta deixou-me colada ao assento:

- Não não, este autocarro vai para Pakse. Pára em Savannakhet também mas é pela uma da manhã.

Agora, para que compreendam bem o meu terror, são precisas algumas explicações complementares. No Sudeste Asiático, quando um autocarro diz que chega a qualquer lado às quatro e meia da manhã, podem quase apostar que vai chegar pelo menos um pouco atrasado - ou mesmo muito. No caso, eu estava a contar chegar a partir das cinco, o que é uma hora relativamente razoável para se chegar a uma cidade nesta zona do mundo. A vida começa cedo por aqui e logo à saída do autocarro há tuk tuks mais do que dispostos a levarem-nos ao centro da cidade. Viajando sozinha, eu optara por jogar pelo seguro e marcara alojamento antecipadamente, tendo garantido por telefone que alguém me abriria a porta da pensão mesmo àquela hora.

Coisa bem diferente é chegar a uma cidade entre a uma ou as duas da manhã, hora em que está tudo a dormir e de porta fechada, sobretudo numa cidade pequena como Savannakhet e num país com recolher obrigatório a partir das onze e meia como o Laos.

Foi por isso que me gelou o sangue a hipótese de me encontrar sozinha, de mochila às costas, deambulando por uma cidade desconhecida nas primeiras horas da madrugada.

- Não está a compreender! Eu não posso chegar a essa hora, não tenho alojamento nem saberia para onde ir!

A minha voz soava esganiçada perante ombros encolhidos e olhares que diziam que o meu interlocutor não fazia ideia de qual fosse a solução. Insisti e voltei a explicar. Comprara o bilhete na guesthouse, tinham-me posto no autocarro errado e eu não podia chegar àquela hora. Tinha de voltar à estação e tentar meter-me no autocarro certo.

De nada adiantou. O meu interlocutor nada podia fazer e o motorista, quando consultado, também não. Os demais passageiros seguiam a trama sem perceberem patavina, até que o que falava comigo fez o favor de resumir a história na língua local e o autocarro prontamente explodiu numa gargalhada. Drama e comédia são, afinal de contas, uma questão de perspectiva.

Por fim, o autocarro encostou na berma e foi-me dada a escolha: ou ficas ou sais. Olhei para o escuro da noite que se adensava lá fora e tremi. Não sabia onde me levaria o outro lado da porta, mas sabia onde me levava este e não seria a nada de bom. Que fazer, que fazer, gritava o meu coração atordoado. Pela primeira vez desde que começara a viagem senti-me verdadeiramente só e sem saber para que lado puxar.

segunda-feira, 10 de março de 2014

Em defesa de Vientiane

Adorava que me caíssem no bolso dez mil kip - coisa para menos de um euro - por cada reacção semi-fria que já ouvi de outros viajantes sobre a cidade de Vientiane. A opinião comum parece ser a de que, para capital, Vientiane é uma real pasmaceira e um satélite quase quase a sair da órbita dos itinerários relevantes no Sudeste Asiático. Certos visitantes, mais encarniçados no seu desgosto, vão mesmo ao ponto de lhe chamarem "a capital mais aborrecida do mundo".

Muitas vezes me perguntei se teríamos estado na mesma cidade. Das duas vezes que por lá passei, num total de quase uma semana, não encontrei razão de queixa contra Vientiane -- muito pelo contrário! Está bem, não estamos propriamente no coração da batida festeira como em Banguecoque. Mas se para alguns isso é um deal breaker, para mim, que gosto das primeiras horas da manhã vividas ao acordar e não antes de ir para a cama, não conta como defeito.

É verdade verdadeira, quase de La Palice, que em grande parte vivemos os lugares como extensão da nossa circunstância, ou seja, que tendemos a gostar mais das cidade em que andámos particularmente felizes e bem acompanhados.

Por essa bitola, é natural que me tenha apegado a Vientiane. A primeira visita, com a L. e a R., foi uma pequena festa contínua e aquilo que falhou em sightseeing foi mais do que amplamente compensado por galhofa, brindes profusos, serões de cartadas e filmes e, sim, até uma celebração antecipada de Ano Novo (em jeito de despedida) com direito a doses copiosas de sushi.

Em suma, confesso desde já o meu a priori favorável por motivos relativamente externos à cidade em si, mas afinal de contas, qual a opinião verdadeiramente objectiva?

De todo o modo, mesmo à segunda visita, primeiro ainda com a L. e por último a solo, Vientiane não perdeu o seu charme. Aliás, depois de alguns passeios à descoberta do que não tinha visitado antes, o meu afecto por esta simpática capital só fez foi crescer. Assim sendo, e rapinando o mote ao poeta Robert Barrett Browning quando perguntava "How do I love thee, let me count the ways", aqui vai a minha lista de cinco razões para ter visitado Vientiane - e gostado!

Razão n.° 1: passeios no paredão, ao pôr-do-sol. Com maré cheia ou maré vaza, o entardecer alaranjado de Vientiane convida turistas e locais a esticarem as pernas junto ao rio, seja em ritmo de jogging ou de simples deambulação, num caminho que se estende por uns bons quarteirões. Para matar a sede, não faltam esplanadas onde estacionar e pedir uma cerveja, um cocktail ou um copo de vinho. Já de regresso, com o cair da noite, a área junto ao parque infantil vai-se enchendo de tendas para um pequeno mas simpático mercado nocturno.

Razão n.° 2: uma inesperada colecção de livros a menos de um euro. O impacto desta afirmação só se entende por completo se se tiver em conta que no Laos o acesso a livros e livrarias não é exactamente abundante e que muitas das vezes uma pessoa se vê limitada às trocas de livros que possam existir nos hostels ou a pequenas lojas que vendem sobretudo literatura de férias e guias de viagem em segunda mão, não raro em volumes copiados que rapidamente se esfrangalham. Mas em Vientiane, nas traseiras do New Wave Hair Studio - isso mesmo, leram bem, salão de cabeleireiro! - fui dar com um conjunto muito apreciável de estantes contendo uma estranha mas interessante mistura, desde clássicos ingleses, a romances contemporâneos, à filosofia. E tudo, absolutamente tudo, por dez mil kip o exemplar. Na impossibilidade de trazer meia sala, fiquei-me pelos fininhos mas substanciais "Siddartha", de Herman Hesse, e "Zen in the Art of Writing", de Ray Bradbury. 

Razão n.° 3: uma visita ao Centro de Visitantes da COPE. A COPE é uma organização sem fins lucrativos que procura dar resposta às necessidades dos sobreviventes de munições por explodir (UXO), cooperando com o Centro de Reabilitação Médica e os centros de reabilitação provinciais para permitir o acesso a próteses e dispositivos ortopédicos e a serviços de reabilitação, incluindo fisioterapia, terapia ocupacional e serviços pediátricos. A missão do Centro de Visitantes é divulgar, através de uma exposição e de documentários vários, a problemática das munições por explodir no Laos, o trabalho das equipas de desminagem e as iniciativas da própria COPE em prol das vítimas destes engenhos. A visita ao Centro foi um dos momentos mais tocantes da minha passagem por Vientiane e abriu-me os olhos para uma problemática cuja verdadeira extensão eu desconhecia. Fiquei a saber, por exemplo, que apesar de não estar formalmemente em guerra com os EUA o Laos foi pesadamente bombardeado no âmbito da guerra com o Vietname e dos esforços para destruir o famoso trilho de Ho Chi Minh. Que é hoje o país mais bombardeado do mundo. Que cerca de oitenta mil quilómetros quadrados do seu território continuam minados, sendo a actual capacidade de desminagem largamente insuficiente para pôr fim ao problema a curto prazo. Que se pensa que todos os anos se registem cerca de trezentos novos casos de vítimas de munições por explodir no país. Um problema muito actual, portanto, que continua a fazer vítimas, e um pedaço de história que não pode ser esquecido, sob pena de se esquecerem também as lições que ele comporta. Para quem estiver na zona, aconselho vivamente uma visita e, para quem estiver longe, uma espreitadela ao site deles.

Razão n.° 4: cafés cheios de charme, boa comida e WiFi muito decente. Porque não um pequeno-almoço Ottomano no Croissant D'Or (TA), um croissant coberto de queijo derretido ou um cheesecake de maracujá no Cafe Sinouk ou um generoso caril acompanhado de um côco bem fresco naquele restaurante da avenida ribeirinha cujo nome imfelizmente não consegui reter? Um dos maiores prazeres de Vientiane é encontrar um destes sítios simpáticos e ficar na conversa, ler um livro, pôr a correspondência em dia ou simplesmente ver gente passar.

Razão n.° 5: o Laos real. Mais do que em Luang Prabang, em Vientiane senti o pulsar de uma cidade que vive e respira para lá do movimento gerado pelo turismo. Talvez por isso não possa esconder uma certa preferência pela capital, ainda que na forma Luang Prabang seja reconhecidamente mais polida, estética, fácil de apreciar.

Resumindo? Já aqui disse que o Laos não é um país do fazer, mas do estar. E Vientiane não foge à regra. Para quem for à procura do bulício e da excitação de uma grande cidade, é provável que venha de lá desapontado. Mas para quem entender o seu ritmo e se deixar levar, para quem se dispuser à magia da lentidão, Vientiane será como um cofre repleto de pequenas pérolas, com a benesse de serem poucos aqueles que estendem a mão para cavar nesse tesouro.

Passeios ao entardecer: antiga escola abandonada
depois de um fogo
Pôr-do-sol à beira-rio
Patuxay, a Porta do Triunfo
Fins de tarde, esplanadas e Beerlao
Estádio Nacional do Laos
Um aroma sem par